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O eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA) é um sistema complexo de interações diretas e feedbacks entre o hipotálamo, a glândula pituitária (também conhecida como hipófise) e as glândulas adrenais (localizadas acima dos rins). Este eixo desempenha um papel fundamental na resposta do corpo ao estresse, regulando muitos processos do corpo, incluindo a digestão, o sistema imunológico, o humor, a sexualidade e a energia. A ação do cortisol, um hormônio esteroide produzido pelas glândulas adrenais, é central para a funcionalidade deste eixo.

Os sistemas biológicos que são considerados proeminentes na etiologia da depressão, particularmente em sua relação com o estresse e a saúde física, incluem o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) e o sistema de resposta inflamatória. A ativação do eixo HPA é uma característica marcante da resposta ao estresse em humanos, servindo como um indicador importante de estresse psicossocial. Além disso, há evidências convincentes de que a exposição ao estresse pode levar a respostas inflamatórias elevadas, tanto no cérebro quanto perifericamente.

Indivíduos com depressão frequentemente exibem níveis elevados de cortisol e maiores concentrações plasmáticas de citocinas pró-inflamatórias, como a proteína C-reativa (PCR). Essas condições, além de estarem associadas ao estresse e à depressão, também têm sido implicadas no desenvolvimento de diversos distúrbios, incluindo aqueles cardiometabólicos, inflamatórios, endócrinos e neurais conforme Iob, E., Kirschbaum, C. & Steptoe (2020).

A teoria do comportamento de doença sugere que respostas inflamatórias e neuroendócrinas aumentadas podem resultar em sintomas somáticos de tipo depressivo, conhecidos como “comportamento de doença” ou “sickness behavior”. Esses sintomas incluem fadiga, problemas de sono, falta de apetite e desaceleração psicomotora. Existe a sugestão de que a relação da depressão com a hiperatividade do eixo HPA e inflamação pode ser predominantemente impulsionada por sintomas somáticos, tais como cansaço e problemas de sono, enquanto as associações com sintomas cognitivo-afetivos, como tristeza e humor deprimido, são consideravelmente menores.

Essas respostas inflamatórias e neuroendócrinas elevadas podem, portanto, contribuir para a patogênese dos componentes somáticos da depressão. Uma limitação importante na pesquisa existente é a utilização de avaliações transversais da depressão, que não distinguem entre sintomas depressivos persistentes e episódicos. Há uma variabilidade substancial na duração e cronicidade dos sintomas entre indivíduos, mesmo entre aqueles com diagnósticos idênticos ou que não atendem aos critérios diagnósticos. Alguns podem experimentar sintomas depressivos ocasionalmente, enquanto outros exibem níveis persistentemente altos de sintomas, conforme sugerido por Iob, E., Kirschbaum, C. & Steptoe (2020).

É crucial reconhecer que os sintomas depressivos persistentes são provavelmente um indicador mais robusto do acúmulo de fatores de risco biológicos que influenciam a depressão. Esta perspectiva enfatiza a necessidade de abordagens terapêuticas e preventivas que considerem a complexidade das interações entre estresse, respostas inflamatórias e neuroendócrinas, e a manifestação de sintomas depressivos, para um tratamento mais eficaz e direcionado da depressão e suas comorbidades associadas. De acordo com Iob, E., Kirschbaum, C. & Steptoe (2020).

Hipotálamo

O processo inicia no hipotálamo, uma região do cérebro que funciona como um centro de controle, regulando a temperatura corporal, a fome, a sede e o ciclo de sono-vigília, entre outros processos vitais. Em resposta ao estresse, o hipotálamo secreta o hormônio liberador de corticotrofina (CRH), que viaja através do sistema vascular portal hipotálamo-hipofisário até a glândula pituitária.

Glândula Pituitária

Ao receber o CRH, a glândula pituitária, uma pequena glândula localizada na base do cérebro, secreta o hormônio adrenocorticotrópico (ACTH) na corrente sanguínea. O ACTH é transportado pelo sangue até as glândulas adrenais.

Glândulas Adrenais

As glândulas adrenais, por sua vez, respondem ao ACTH produzindo e liberando cortisol na corrente sanguínea. O cortisol é conhecido como o “hormônio do estresse” devido ao seu papel na resposta do corpo ao estresse. Ele tem várias funções importantes, como aumentar a glicose no sangue através da gliconeogênese, suprimir o sistema imunológico e ajudar no metabolismo das gorduras, proteínas e carboidratos.

Ação do Cortisol

O cortisol atua em muitos tecidos do corpo e tem vários efeitos, incluindo:

  • Regulação do Metabolismo: Ajuda a controlar o uso do corpo de carboidratos, gorduras e proteínas.
  • Resposta Supressora ao Sistema Imunológico: Pode reduzir a inflamação.
  • Aumento da Glicose no Sangue: Fornece energia rápida ao corpo ao aumentar a glicose sanguínea.
  • Controle da Pressão Sanguínea: Influencia os níveis de sal e água no corpo.

Feedback Negativo

O sistema é regulado por um mecanismo de feedback negativo, onde o aumento dos níveis de cortisol inibe a liberação de CRH pelo hipotálamo e de ACTH pela glândula pituitária, mantendo assim os níveis de cortisol dentro de uma faixa normal.

Além dessas estruturas primárias, o fígado, o pâncreas e outras áreas do corpo também estão envolvidas na modulação e nos efeitos das respostas mediadas pelo eixo HPA.

Fígado

O fígado tem um papel vital na regulação da energia corporal durante o estresse, principalmente através da metabolização do cortisol. O cortisol estimula a gliconeogênese no fígado, um processo pelo qual o fígado converte aminoácidos e outros substratos em glicose, fornecendo energia rápida ao corpo para lidar com situações de estresse. Além disso, o fígado também participa na conversão do cortisol inativo (cortisona) de volta ao seu estado ativo, regulando assim a disponibilidade do cortisol para seus efeitos em todo o corpo.

Pâncreas

O pâncreas, embora mais conhecido por seu papel na regulação da glicose sanguínea através da insulina e do glucagon, também é influenciado pelo cortisol. O cortisol pode inibir a secreção de insulina pelo pâncreas, contribuindo para o aumento da glicose sanguínea, assegurando que haja energia suficiente disponível para os tecidos durante o estresse. Essa interação destaca a importância da coordenação entre o eixo HPA e o sistema endócrino pancreático na gestão da energia corporal e na resposta ao estresse.

Outras Áreas Envolvidas

  • Sistema Cardiovascular: O cortisol tem efeitos significativos no sistema cardiovascular, incluindo a regulação da pressão sanguínea e do volume sanguíneo. Isso é crucial durante o estresse, pois o corpo precisa garantir um suprimento adequado de sangue aos órgãos vitais.
  • Sistema Imunológico: O cortisol suprime a atividade imunológica, reduzindo a inflamação e a resposta imune para evitar uma reação exagerada do corpo ao estresse, o que poderia ser prejudicial a longo prazo.
  • Tecido Adiposo e Músculo Esquelético: O cortisol promove a mobilização de ácidos graxos a partir do tecido adiposo e a proteólise no músculo esquelético, fornecendo substratos energéticos adicionais ao corpo.
  • Cérebro: O cortisol exerce vários efeitos no cérebro, incluindo a modulação do humor, da memória e da cognição. O hipocampo, que é sensível ao cortisol, desempenha um papel fundamental na terminação da resposta ao estresse através do mecanismo de feedback negativo ao eixo HPA.

O eixo HPA é um sistema de feedback dinâmico que regula a resposta do corpo ao estresse. Os órgãos envolvidos – hipotálamo, glândula pituitária e glândulas adrenais – trabalham juntos para produzir e regular o cortisol, que, por sua vez, desempenha um papel vital em muitos processos do corpo, ajudando a manter a homeostase durante períodos de estresse. Este sistema exemplifica a interconexão entre o sistema nervoso e o sistema endócrino, ilustrando a complexidade dos mecanismos de resposta ao estresse do corpo.

CORTISOL

Os glicocorticoides, incluindo o cortisol, são hormônios esteroides fundamentais envolvidos na resposta ao estresse. Sua produção é regulada pelo eixo hipotálamo-pituitário-adrenal (HPA). Durante um momento de estresse, os neurônios do hipotálamo secretam o hormônio liberador de corticotrofina (CRH), que, por sua vez, estimula a hipófise a secretar o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH alcança as glândulas adrenais, ativando a secreção de glicocorticoides, dos quais o cortisol é a versão humana. Estes hormônios têm múltiplas funções, incluindo a modulação da resposta imune, a regulação do metabolismo energético e a influência sobre processos inflamatórios​​.

A concentração de CRH (hormônio liberador de corticotropina) no líquido cefalorraquidiano tem sido destacada como um dos achados mais robustos em psiquiatria biológica, especialmente em pacientes com depressão grave. Observou-se que a hiperatividade do eixo HPA (hipotálamo-pituitária-adrenal) nesses pacientes está associada a níveis elevados de cortisol sanguíneo, bem como a uma concentração aumentada de CRH no líquido cefalorraquidiano. Esse fenômeno sugere que um sistema HPA hiperativo e seus efeitos negativos sobre a função cerebral poderiam ser uma causa subjacente da depressão. Estudos em animais apoiam essa hipótese, demonstrando que injeções de CRH no encéfalo produzem efeitos comportamentais que mimetizam os da depressão maior, incluindo insônia, diminuição do apetite, redução do interesse sexual e aumento na expressão de comportamentos de ansiedade​​.

O mecanismo pelo qual o eixo HPA regula a resposta ao estresse envolve as células neurossecretoras parvocelulares do hipotálamo, que liberam CRH na circulação porta hipofisária. Isso leva à liberação de ACTH pela adeno-hipófise, que por sua vez estimula a liberação de cortisol pelo córtex da glândula suprarrenal. O cortisol, sendo lipofílico, atravessa facilmente a barreira hematoencefálica e interage com receptores específicos no cérebro para inibir a liberação de CRH, mantendo os níveis de cortisol circulante dentro de um limite saudável. Esse sistema de retroalimentação é crucial para evitar níveis excessivamente altos de cortisol, mas pode ser afetado pelo uso de prednisona, uma forma sintética do cortisol, alterando a percepção do cérebro sobre os níveis de cortisol natural​​.

Estudos recentes indicam que a sinalização insuficiente de glicocorticoides pode estar presente em transtornos neuropsiquiátricos relacionados ao estresse, contribuindo para patologias associadas, como alterações no comportamento, sensibilidade à insulina, metabolismo ósseo e respostas imunes. A redução na sinalização de glicocorticoides, seja no nível do hormônio ou de seu receptor, pode aumentar a prontidão imune e a reatividade, destacando a importância de desenvolver terapias que intensifiquem as vias de sinalização de glicocorticoides para tratar patologias relacionadas ao estresse​​.

FUNÇÕES DO SISTEMA ENDÓCRINO ENVOLVIDAS

O sistema endócrino, através do eixo HPA, interage com várias outras partes do corpo para regular uma ampla gama de processos biológicos. Além da resposta ao estresse, o eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA) e o sistema endócrino como um todo desempenham papéis fundamentais na regulação de uma ampla gama de processos fisiológicos essenciais para a manutenção da homeostase corporal. Estes incluem o metabolismo, o sistema imunológico, os processos inflamatórios, a pressão sanguínea, entre outros.

Regulação do Metabolismo

O eixo HPA tem um papel fundamental na regulação do metabolismo energético. O cortisol, um hormônio liberado pelas glândulas adrenais sob controle do eixo HPA, aumenta a glicose no sangue, promove a quebra de lipídios e proteínas, e inibe a ação da insulina, ajudando assim a fornecer energia ao corpo durante períodos de estresse. Este processo assegura que os tecidos vitais, como o cérebro, tenham um suprimento adequado de nutrientes e energia.

Sistema Imunológico e Processos Inflamatórios

O cortisol exerce um efeito supressor sobre o sistema imunológico. Embora a curto prazo, esta seja uma medida protetora para prevenir uma resposta imune exagerada durante o estresse agudo, a exposição prolongada ao cortisol pode levar à imunossupressão, aumentando o risco de infecções e doenças. O cortisol também modula a resposta inflamatória, reduzindo a produção de substâncias pró-inflamatórias e limitando a inflamação.

Pressão Sanguínea

O eixo HPA influencia a pressão sanguínea através do cortisol e de sua interação com o sistema renina-angiotensina-aldosterona (RAAS), que regula o volume de fluidos e a pressão sanguínea. O cortisol pode suportar a ação da aldosterona, contribuindo para a retenção de sódio e água pelos rins, o que pode aumentar a pressão sanguínea.

Outras Funções

  • Regulação Térmica: O eixo HPA também está envolvido na regulação da temperatura corporal, mediando respostas ao frio e ao calor.
  • Funções Reprodutivas: O eixo HPA pode influenciar o sistema reprodutivo, onde o estresse crônico pode afetar negativamente a função reprodutiva ao suprimir o eixo gonadotrópico.
  • Comportamento e Humor: Além de suas funções fisiológicas, o eixo HPA afeta o comportamento e o humor, estando envolvido na patogênese de distúrbios como a depressão e a ansiedade.

A função do eixo HPA não é isolada; ela está intrinsicamente ligada a outras partes do sistema endócrino, como a glândula tireoide, as glândulas gonadais, e o pâncreas, entre outros. Por exemplo, o cortisol pode influenciar o metabolismo através da interação com os hormônios tireoidianos, enquanto o estresse crônico pode afetar a função reprodutiva suprimindo o eixo gonadotrópico.

É conhecido que o cortisol, um glicocorticoide produzido pela glândula adrenal em resposta ao estresse e baixos níveis de glicocorticoides no sangue, desempenha um papel fundamental na regulação de diversas funções corporais, incluindo o metabolismo de glicose, proteínas, e lipídeos, além de influenciar o sistema imunológico e a resposta inflamatória. O cortisol tem efeitos sobre o metabolismo energético e pode interagir com hormônios tireoidianos, que são fundamentais para a regulação metabólica, indicando uma complexa rede de interações entre os sistemas endócrinos.

Além disso, o estresse crônico é conhecido por afetar o sistema reprodutivo, o que pode envolver a supressão do eixo gonadotrópico. O eixo gonadotrópico é responsável pela regulação dos hormônios que controlam o desenvolvimento, o crescimento, e a função reprodutiva. O estresse crônico pode levar a alterações nos níveis de gonadotrofinas, potencialmente afetando a função reprodutiva.

O eixo HPA é um componente fundamental do sistema endócrino, atuando como um mecanismo chave na resposta do corpo ao estresse e na manutenção da homeostase. Através de uma rede complexa de feedbacks hormonais, ele interage com praticamente todos os sistemas do corpo, sublinhando a interconexão profunda entre o sistema endócrino e a fisiologia corporal como um todo.

HIPERATIVIDADE DO EIXO HPA

A hiperatividade do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA) pode ter implicações significativas no metabolismo da glicose e potencialmente levar à hipoglicemia, especialmente sob condições de estresse prolongado ou crônico. Embora não tenha encontrado referências específicas nos documentos disponíveis que detalhem diretamente a relação entre a hiperatividade do eixo HPA e o gasto de glicose até gerar hipoglicemia, é possível inferir com base em conhecimentos gerais sobre o papel do eixo HPA no metabolismo e no estresse.

O eixo HPA é crucial na resposta do organismo ao estresse, regulando a liberação de cortisol pelas glândulas adrenais. O cortisol tem efeitos profundos sobre o metabolismo energético, incluindo a promoção da gliconeogênese — o processo pelo qual o fígado gera glicose a partir de precursores não-carboidratos. Sob estresse, o aumento da atividade do eixo HPA e a subsequente elevação dos níveis de cortisol podem inicialmente levar a um aumento nos níveis de glicose no sangue, como parte da resposta “lutar ou fugir”, fornecendo energia prontamente disponível para o corpo enfrentar a situação de estresse.

No entanto, a hiperatividade prolongada do eixo HPA pode alterar esse equilíbrio. A exposição crônica a altos níveis de cortisol pode levar a várias consequências metabólicas, incluindo resistência à insulina, que é um fator de risco para o desenvolvimento de diabetes tipo 2. Além disso, o efeito do cortisol sobre o aumento da gliconeogênese e a redução da captação de glicose pelos tecidos pode, paradoxalmente, levar a episódios de hipoglicemia, especialmente quando os recursos energéticos do corpo estão esgotados ou quando há uma resposta inadequada à insulina.

Contudo, a relação entre a hiperatividade do eixo HPA e a hipoglicemia é mais indireta. A hipoglicemia ocorre quando há mais glicose sendo consumida pelo corpo do que sendo produzida ou ingerida. Em alguns casos, após o esgotamento inicial dos recursos de glicose gerados pela gliconeogênese estimulada pelo cortisol, o corpo pode passar a um estado de hipoglicemia se o estresse persistir e os recursos energéticos se esgotarem. Esse cenário é mais provável em situações de estresse crônico, onde o consumo contínuo de glicose, sem reposição adequada através da alimentação ou diminuição da demanda metabólica, pode levar à hipoglicemia.

Além disso, a hiperatividade do eixo HPA pode afetar a sensibilidade à insulina, potencialmente exacerbando flutuações nos níveis de glicose no sangue. Em longo prazo, isso pode contribuir para um desequilíbrio no controle glicêmico e, em circunstâncias extremas, a episódios de hipoglicemia, especialmente se o consumo de glicose pelo corpo for alto devido ao estresse metabólico contínuo.

Dessa forma, enquanto o eixo HPA desempenha um papel adaptativo essencial na resposta inicial ao estresse, sua hiperatividade crônica pode desencadear desequilíbrios no metabolismo da glicose. Esses desequilíbrios podem resultar em flutuações nos níveis de glicose, aumentando o risco de hipoglicemia, especialmente em situações onde o consumo de glicose é elevado e não compensado por ingestão alimentar adequada ou pela liberação de glicose hepática. A compreensão desses mecanismos é crucial para desenvolver estratégias terapêuticas para mitigar os efeitos negativos da hiperatividade do eixo HPA sobre o metabolismo da glicose​​.

É importante lembrar que a relação entre o eixo HPA, o cortisol, e o metabolismo da glicose é influenciada por múltiplos fatores, incluindo a saúde geral do indivíduo, a presença de doenças crônicas, a dieta, e o nível de atividade física. Portanto, a maneira como a hiperatividade do eixo HPA influencia o gasto de glicose e potencialmente leva à hipoglicemia pode variar significativamente entre os indivíduos.

FEBRE

A febre é uma resposta fisiológica complexa do organismo a infecções, inflamações ou outras condições médicas, atuando como um mecanismo de defesa que facilita a luta do corpo contra agentes patogênicos. Ela se manifesta através do aumento controlado da temperatura corporal acima do normal, o que pode afetar diversos aspectos do funcionamento do corpo, desde o metabolismo até o comportamento.

O processo da febre é desencadeado por substâncias pirogênicas, que podem ser externas (como toxinas bacterianas) ou internas (como citocinas liberadas em resposta a uma infecção). Estas substâncias estimulam a produção de prostaglandinas no cérebro, em especial a prostaglandina E2 (PGE2), que atua no hipotálamo para elevar o ponto de ajuste da temperatura corporal.

Este mecanismo de resposta, conhecido como “comportamento de doente”, envolve uma série de mudanças fisiológicas, comportamentais e hormonais destinadas a aumentar a sobrevivência do hospedeiro. Além do aumento da temperatura, o comportamento de doente pode incluir diminuição da locomoção, redução do consumo de alimentos e água, e alterações na composição do sangue. O objetivo é maximizar as chances de sobrevivência frente a infecções, concentrando recursos energéticos no sistema imune e reduzindo a exposição a novos patógenos e predadores.

A febre também estimula o sistema imunológico, aumentando a eficiência da resposta imune. A temperatura elevada pode inibir o crescimento de certos patógenos, acelerar a reparação tecidual e aumentar a mobilidade de células defensivas, como leucócitos.

É importante notar que a febre é apenas um dos componentes do comportamento de doente, que também pode ser observado em contextos de inflamação subclínica crônica, como em alguns transtornos psiquiátricos, principalmente a depressão​​. O entendimento dessa resposta fisiológica complexa é crucial para o tratamento eficaz de diversas condições médicas, enfatizando a importância da regulação térmica na manutenção da saúde e no combate a doenças.

O eixo HPA regula a secreção de cortisol pela glândula suprarrenal em resposta ao estresse. O processo começa com a liberação do hormônio liberador de corticotropina (CRH) pelo hipotálamo, que então estimula a adeno-hipófise a liberar o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH viaja pelo sangue até as glândulas suprarrenais, localizadas acima dos rins, estimulando-as a liberar cortisol. O cortisol, por sua vez, ajuda a promover mudanças fisiológicas necessárias à resposta de luta ou fuga, preparando o corpo para enfrentar ou se afastar da ameaça percebida​​.

Alterações na atividade do eixo HPA podem ter um impacto significativo na regulação da temperatura corporal. O cortisol, sendo um poderoso glicocorticoide, tem efeitos amplos sobre o metabolismo, o sistema imunológico e a resposta inflamatória. Em situações de estresse prolongado, a produção excessiva de cortisol pode levar a uma resposta inflamatória aumentada, o que, por sua vez, pode contribuir para o desenvolvimento de febre. A febre, sendo um mecanismo de defesa do corpo, eleva a temperatura corporal como uma resposta ao estresse ou infecção, facilitando a ativação do sistema imunológico e a proteção contra patógenos.

Portanto, a relação entre o eixo HPA, a temperatura corporal e a febre é um reflexo de como o corpo responde ao estresse e regula a inflamação. O aumento na produção de cortisol, mediado pela ativação do eixo HPA em resposta ao estresse, pode influenciar a temperatura corporal e desencadear febre como parte da resposta do corpo para proteger e curar a si mesmo.

RESPOSTA INFLAMATÓRIA AUMENTADA

A resposta inflamatória aumentada tem um papel significativo na neurobiologia de diversos transtornos psiquiátricos, incluindo o Transtorno Depressivo Maior (TDM). O estresse é um fator importante que pode desencadear uma resposta inflamatória, mesmo que de baixo grau, com ativação de células microgliais. Isso pode culminar em excitotoxicidade, evidenciando o envolvimento do sistema glutamatérgico na fisiopatologia do TDM​​.

A ativação do eixo HPA em resposta a um evento estressor leva ao aumento da circulação de glicocorticoides (GCs) e catecolaminas, gerando uma resposta adaptativa ao estresse agudo. Os GCs, ao atravessarem a barreira hematoencefálica, ligam-se aos receptores de GC no cérebro, interagindo com células neuronais e microgliais para controlar o processo inflamatório. No entanto, sob estresse crônico, essa resposta pode se tornar maladaptativa, mantendo um estado inflamatório que pode levar a alterações neurobiológicas prejudiciais na condução sináptica e na plasticidade neuronal, aumentando o risco para o desenvolvimento de transtornos mentais​​.

Essa hiper-reatividade do sistema pode promover a ativação contínua de células e a manutenção de um estado inflamatório que, mesmo após a extinção do evento estressor, pode gerar alterações neurobiológicas deletérias. A neuroinflamação é um processo complexo que envolve a comunicação entre o sistema imune periférico e o central, mediada por uma interação bioquímica complexa, onde citocinas liberadas pelos neutrófilos e macrófagos periféricos ativam a micróglia no SNC. Esta ativação pode levar a uma cascata de eventos inflamatórios, exacerbando a resposta inflamatória e potencialmente contribuindo para a patogênese do TDM.

NEUROTICISMO E HIPERATIVIDADE DO EIXO HPA

A hiperatividade do eixo HPA tem sido amplamente estudada e associada a várias condições psiquiátricas, incluindo depressão. O neuroticismo é um traço de personalidade caracterizado por tendências para experimentar emoções negativas, como ansiedade, raiva, ou depressão, mais frequentemente e intensamente do que o típico. Este traço é um dos cinco principais fatores de personalidade na teoria dos Cinco Grandes, que também inclui abertura à experiência, conscienciosidade, extroversão e amabilidade.

Pessoas com altos níveis de neuroticismo podem ter uma maior predisposição a transtornos de humor e ansiedade, e sua alta reatividade emocional pode influenciar a maneira como lidam com o estresse, resolvem problemas e tomam decisões. Embora o neuroticismo possa aumentar o risco de desenvolver problemas de saúde mental, também é importante notar que é apenas um dos muitos fatores que contribuem para o bem-estar psicológico e emocional.

A resposta ao estresse, frequentemente descrita pelo mecanismo de “luta ou fuga”, é classicamente entendida como a reação masculina predominante ao estresse, reflexo de uma vasta literatura científica majoritariamente focada em estudos com homens. Esse mecanismo prepara o organismo para enfrentar ou fugir de ameaças imediatas, uma resposta adaptativa que mobiliza recursos físicos e mentais para a sobrevivência. No entanto, a pesquisadora da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) aponta para uma dinâmica distinta em resposta ao estresse nas mulheres, denominada “cuidar e integrar” (tend and befriend). Esse modelo sugere que, diante do estresse, as mulheres são mais propensas a cuidar dos mais jovens e buscar apoio e afiliação social, uma estratégia que também contribui para a sobrevivência, mas através do fortalecimento das conexões sociais e apoio mútuo. Esse padrão de resposta ao estresse nas mulheres provavelmente envolve um papel significativo da ocitocina, um hormônio associado ao comportamento de vinculação e cuidado​​.

Essa distinção entre as respostas ao estresse reflete diferenças biológicas e comportamentais fundamentais entre os sexos, mas também sublinha a importância da ocitocina na modulação das respostas sociais ao estresse. A ocitocina é conhecida por promover comportamentos sociais positivos, como o vínculo entre mãe e filho, a cooperação e a empatia, sugerindo que a resposta de “cuidar e integrar” não é apenas uma estratégia de enfrentamento do estresse, mas uma manifestação intrínseca da biologia feminina que fortalece as relações sociais e a coesão do grupo.

Quando o eixo HPA é hiperativo, observa-se um aumento nos níveis sanguíneos de cortisol, assim como uma concentração elevada de CRH (hormônio liberador de corticotropina) no líquido cerebrospinal. Esta hiperatividade pode levar a efeitos deletérios sobre a função cerebral, contribuindo para a manifestação de sintomas depressivos e ansiosos. Estudos em animais sugerem que injeções de CRH no encéfalo podem induzir comportamentos semelhantes aos observados na depressão maior, como insônia, diminuição do apetite, redução do interesse sexual e aumento de comportamentos de ansiedade​​.

Essas descobertas sugerem uma ligação entre a hiperatividade do eixo HPA e o neuroticismo, onde o aumento da resposta ao estresse, mediado por altos níveis de cortisol e CRH, pode predispor indivíduos a uma maior sensibilidade a emoções negativas e a estados de humor depressivos. Além disso, o neuroticismo pode influenciar a percepção e a resposta ao estresse, potencialmente exacerbando a ativação do eixo HPA, criando um ciclo vicioso que contribui para a vulnerabilidade a transtornos de humor e ansiedade.

Portanto, a relação entre a hiperatividade do eixo HPA e o neuroticismo é complexa e bidirecional, com implicações significativas para o entendimento e tratamento de condições psiquiátricas relacionadas ao estresse e à regulação emocional.

O ESTRESSE

Na neurociência, o estresse é compreendido como uma resposta complexa do corpo a estímulos percebidos como ameaçadores ou desafiadores. Essa resposta envolve uma série de reações fisiológicas e comportamentais coordenadas, destinadas a ajudar um organismo a lidar com ameaças potenciais. O conceito central do estresse envolve o “estressor”, que é o elemento desencadeador dessa resposta, e a “resposta ao estresse”, que é a maneira pela qual o corpo responde a tal estressor.

A resposta ao estresse é multifacetada, incluindo aspectos comportamentais, como o comportamento de esquiva, o aumento na vigilância e no alerta, além da ativação da divisão simpática do sistema nervoso visceral, resultando em mudanças fisiológicas como a liberação de cortisol pelas glândulas suprarrenais. O hipotálamo desempenha um papel central na orquestração dessas respostas, medindo a resposta humoral através do eixo HPA.

O estado de vigilância e prontidão refere-se à capacidade do cérebro de manter-se alerta e preparado para responder rapidamente a estímulos ou situações que exigem atenção imediata. Este estado é crucial para a sobrevivência, pois permite ao indivíduo perceber e reagir a possíveis ameaças ou oportunidades no ambiente. Envolve uma série de processos cognitivos e fisiológicos que facilitam a atenção seletiva, o processamento sensorial aumentado e a preparação motora para a ação.

No nível cerebral, o sistema de ativação reticular ascendente (SARA) desempenha um papel central na regulação do estado de vigilância e prontidão. Este sistema, localizado no tronco encefálico, envia sinais para várias partes do cérebro, incluindo o córtex cerebral, para manter o estado de alerta e a consciência. A atenção, um componente chave desse estado, permite que o cérebro foque recursos cognitivos em estímulos específicos, enquanto ignora outros menos relevantes, otimizando assim a capacidade de resposta.

O estado de vigilância e prontidão também envolve a preparação do corpo para ação, mediada pelo sistema nervoso autônomo, especificamente pela ativação do sistema nervoso simpático. Isso resulta em várias respostas fisiológicas, como aumento da frequência cardíaca, dilatação das pupilas e liberação de adrenalina, preparando o corpo para reagir eficientemente, seja para lutar ou fugir de uma ameaça.

Além disso, a manutenção desse estado é influenciada por fatores internos e externos, incluindo o ritmo circadiano, que regula os ciclos de sono e vigília, e a exposição a estímulos ambientais que podem aumentar a prontidão, como luz forte ou sons altos. Distúrbios neste sistema de vigilância podem levar a problemas de atenção, hiperatividade ou, inversamente, a estados de letargia e falta de resposta a estímulos importantes.

A resposta ao estresse não é uniforme e varia significativamente entre indivíduos, sendo influenciada por fatores genéticos e experiências de vida. Enquanto o medo é uma resposta natural e adaptativa a ameaças imediatas, caracterizado por uma resposta de luta ou fuga, os transtornos de ansiedade surgem quando a resposta ao estresse se torna desproporcional à ameaça real ou persiste na ausência de um estressor concreto. Assim, a compreensão da ansiedade e do estresse envolve não apenas a identificação dos estímulos que desencadeiam essas respostas, mas também a análise de como essas respostas são reguladas e processadas no cérebro.

A neurociência do estresse, portanto, aborda como o cérebro e o corpo interagem diante de desafios, como as respostas de estresse são mediadas no nível molecular e celular, e como essas respostas afetam a saúde física e mental. O estudo do estresse e de seus mecanismos biológicos é crucial para compreender uma ampla gama de condições médicas e psicológicas, incluindo transtornos de ansiedade, depressão e doenças cardiovasculares, bem como para o desenvolvimento de estratégias de tratamento e prevenção eficazes.

 

 

Referências

 

 

Iob, E., Kirschbaum, C. & Steptoe, A. Persistent depressive symptoms, HPA-axis hyperactivity, and inflammation: the role of cognitive-affective and somatic symptoms. Mol Psychiatry 25, 1130–1140 (2020). https://doi.org/10.1038/s41380-019-0501-6

 

Owen Chan, Stephen Chan, Karen Inouye, Kathy Shum, Stephen G. Matthews, Mladen Vranic; Diabetes Impairs Hypothalamo-Pituitary-Adrenal (HPA) Responses to Hypoglycemia, and Insulin Treatment Normalizes HPA but not Epinephrine Responses . Diabetes 1 June 2002; 51 (6): 1681–1689. https://doi.org/10.2337/diabetes.51.6.1681

 

 

Outros títulos

“The Neurobiology of Criminal Behavior” – Anthony Walsh

“Neurociências: Desvendando o Sistema Nervoso” – Mark F. Bear

“How Emotions Are Made: The Secret Life of the Brain” – Lisa Feldman Barrett

“Comporte-se: A Biologia Humana em Nosso Melhor e Pior” – Robert M. Sapolsky

“The Neuroscience of Emotion: A New Synthesis” – Ralph Adolphs

“Neurociência da Mente e do Comportamento” – Roberto Lent

 

Autor - Petter Anderson Lopes

Autor - Petter Anderson Lopes

Consultor em Neurociência do Comportamento Humano | Saúde Mental e Terapia

Especialista em Neurociência e Comportamento (Pós-Graduado (Latu Sensu)), Especialista em Farmacologia Clínica Baseada em Evidência (Pós-Graduado (Latu Sensu)), Especialista em Psicanálise (Pós-Graduado (Latu Sensu)), e diversas formações nas áreas de tecnologia da informação, investigação e assuntos relacionados ao comportamento e conduta humana.

Autor, Professor e Pesquisador com foco em Neurociência do Comportamento e Neurotecnologia.

Livros recentes:

DARK TRIAD – A TRÍADE SOMBRIA DA PERSONALIDADE

Quem é você? A Neurociência por Trás da Personalidade, Muito além da superfície